A miséria que nos causam os pontos cegos de personalidade

A miséria que nos causam os pontos cegos de personalidade

Certa vez, participei de uma conversa que me calou por dentro. Um amigo perguntou, para um conhecido, o que este fazia para aliviar seu stress.

O colega em questão respondeu que não tinha absolutamente nenhum estresse, pois tinha uma vida muito boa por causa de seu emprego. Até aí, vê-se a sorte de alguém que gosta de seu trabalho.

Mas o silêncio foi total. Isso porque a pessoa a dar esta resposta era simplesmente alguém que raramente sorria ou conversava com os outros. Alguém que parecia viver o estresse constantemente. Eu conhecia seu comportamento e fiquei atônita com a resposta.

Ao mesmo tempo em que lamentei a falta de noção de felicidade por parte desta pessoa, também me lembrei de algo que a psicanálise chama de “ponto cego de personalidade”.

Todo ser humano possui o seu, assim como um espelho retrovisor. Ao me lembrar desta característica, que todos possuímos, imediatamente parei de julgar o colega e simplesmente refleti sobre a situação.

Meu amigo acreditava piamente que era feliz. Porém, olhando de fora, posso afirmar que esta pessoa estava quase sempre de mau humor, não sorria e não conversava com quase ninguém em seu trabalho.

Irritava-se e ofendia com facilidade. É claro como água que se tratava de uma pessoa estressada. Mas o colega não mentiu ao dizer que não sofria estresse algum. Eu percebi, simplesmente, que se tratava do “ponto cego de personalidade” dele.

O “ponto cego de personalidade” vem a ser uma ou mais características que se carrega e não se tem capacidade para enxergar, devido à dificuldade que se possui para mudar tal ou tais pontos em si mesmo. Todos veem, excepto o indivíduo em questão. E o defeito está ali, tão nítido, que o cidadão é até atacado por isso: falam-lhe pelas costas. E, apesar de óbvio, só ele mesmo não é capaz de perceber.

Quem não conhece alguém assim? O mentiroso que acredita enganar a todos, quando ele mesmo é o único que não percebe sua óbvia falsidade. O fofoqueiro que fala da vida alheia, sem nunca se dar conta do quanto fala mal de si mesmo. O invejoso que sofre aquilo que não possui.  E tantos outros exemplos.

Por que, afinal, não somos capazes de enxergar aquilo que todo mundo enxerga sobre nós mesmos?

Por que é tão difícil?

Todas as respostas vão em direcção ao autoconhecimento. Maturidade, vontade de evoluir, sair do lugar do comum, dando adeus à zona de conforto de si mesmo.

Entender quem se é vem a ser o primeiro passo para se enxergarem os pontos cegos de personalidade. Mais do que o conhecimento em psicologia ou psiquiatria, o olhar para dentro: porque eu fiz isto? Por que eu agi assim? Por que me sinto magoado em determinada situação? Será, mesmo, que minhas atitudes são correctas neste ou naquele momento? Nada vale mais do que a reflexão sobre si mesmo.

Os pontos cegos de personalidade não dependem de inteligência ou de conhecimento. Meu amigo, por exemplo, é uma pessoa inteligentíssima, mas que parece não ter noção da sua falta de inteligência emocional.

É fácil identificar o ponto cego de personalidade alheio, mas reagir sobre nossos pontos e não sobre o dos outros é o que realmente muda alguma coisa. Vendo o que não se quer ver. De certa forma, somos todos vítimas de nós mesmos, de nossas misérias interiores e  da incapacidade de nos enxergarmos como realmente somos.

Com coragem e humildade, devemos olhar os nossos pontos cegos e deixar de nos espantar com os pontos dos outros. Pois mais vale uma boa miopia a ser melhorada a cada dia do que uma cegueira a vida inteira.

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